7º Capítulo
Ningbo, quarta-feira, 16 de março de 2005
Como sempre, a expetativa da descoberta diária não me
deixava pregar olho de manhã, apesar de ainda sentir a presença do jet lag.
Ningbo acordou cinzento, como a maior parte das cidades chinesas híper poluídas
e não convida a sair em passeio a pé na descoberta da cidade.
Tomei o pequeno almoço no hotel, este sim já com o standard
internacional, usado e abusado em ovos, bacon, feijão, pão, fruta e fritos. 90
euros pela estadia têm que proporcionar algum conforto extra.
Nesse mesmo dia estava prevista uma viagem a Cixi,
ligeiramente a Norte, a meio caminho de Shangai. 250 RMB para 120
Km num audi novinho, branco, dando ares de novo-riquismo. É a “cara
chapada” da China do século XXl. Montes de sinais exteriores de riqueza onde a
ostentação é uma palavra de ordem. Dinheiro, dinheiro e mais dinheiro. A
passagem do oito ao oitenta degenerou num novo-riquismo ofuscante e ostensivo,
onde tudo brilha a imitar ouro ou diamantes. Os pobres, para parecerem ricos,
usam e abusam de produtos contrafeitos e os ricos fazem questão de apresentar o
original da marca, salientando essa diferença afirmando que se trata de produto
genuíno. Mostrar capacidade financeira acima da média, mesmo sem “ter onde cair
morto”, e ostentar sinais exteriores de riqueza é moda em alta na China, da
mesma forma que calças à boca de sino o foram no seu tempo.
Nesta altura do campeonato questionam-se Vossas Senhorias
como é que eu comia. Com os pauzinhos ou com faca e garfo. Desde o primeiro dia
que passei a comer com pauzinhos (que utilizo nas refeições diárias desde 2005),
embora o mais complicado não fosse comer dessa forma, mas sim ter uma refeição
sem prato raso onde se coloca a comida, tirada com uma colher de servir, maior.
Na China (e nas refeições de grupo em que participei), tínhamos a
mesa redonda e outra mais pequena por cima da principal, que roda com as
iguarias escolhidas. Retiramos os produtos da travessa com os nossos próprios
pauzinhos, tendo como suporte um prato de sobremesa. Que desassossego!
Actualmente consigo retirar até ao último bago de arroz do prato, tal é a
destreza que o treino contínuo me proporcionou. À data conseguia pôr toda a
gente a rir e a fazer comentários pouco abonatórios entre
dentes.
Já tinha começado a aventura dos pauzinhos nos
restaurantes desde que tinha começado a comer na China. Ora umas vezes com mais
sucesso quando era o caso de comida pouco lisa, mas o caso mudou de figura
quando fui buscar um ovo de codorniz ao prato, que escorregava por tudo quanto
era sitio. Burro. Não me lembrei que os pauzinhos também espetam.
Descobri que a cozinha chinesa é bastante boa, diria
mesmo muitíssimo boa. Tem uma grande variedade de vegetais, peixe, carne, etc.
Tenho comido muito bem e barato. Os chineses são mestres cozinheiros fabulosos
que, para além de cozinharem bem, fazem-no na hora e com uma destreza e
habilidade fenomenais.
Depois de percorrida a distância entre Ningbo e Cixi,
encontrei-me com a Joanna Zhu, onde comecei a visita às fábricas de móveis de
estilo tradicional chinês. Lacados, envernizados rústicos, encerados rústicos,
etc. Um mundo com muito mobiliário doméstico, um dos motivos que me tinha feito
apanhar o avião rumo à China. Fomos a algumas fábricas e armazéns. Os móveis
chineses tinham um custo bastante acessível, muito barato. A dificuldade está
na quantidade, na qualidade, na necessidade de ter “stock”, no tempo com o
dinheiro empatado, custos de viagem, em suma, logística para gerir tudo isto.
Outro pormenor importante é o facto das nossas
distâncias não terem nada a ver com as deles. Para nós ir de Lisboa a
Leiria são 130 km, 1 horita mais ou menos. Na China, para fazermos o
mesmo percurso em distâncias equivalentes temos que pensar no estado do piso da
estrada, na ausência de cruzamentos desnivelados, no trânsito caótico, nos
camiões que não saem da faixa da esquerda, das bicicletas de 3 rodas que
estorvam que se fartam, nos tractores a 30 à hora e nos milhões de bicicletas
que passam nas passadeiras, onde ninguém lhes cede passagem, mas que na hora da
verdade são tantos que não dá para passar por cima. A máxima para andar na
estrada é passar depressa, primeiro que o outro, mas sem causar acidentes. É
completamente proibido tocar no que quer que seja. Evitam o acidente a todo o
custo, à custa da buzina e de uma condução que não alcança o que está só
imediatamente à sua frente, lêem o trânsito duma forma diferente. Ou seja, este
mesmo percurso demorou 2 a 3 horas.
Continua…
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