quarta-feira, 13 de março de 2024

1º Capítulo - Domingo, 13 de março de 2005



1º Capítulo

Lisboa, Amesterdão, Hong Kong - Domingo, 13 de março de 2005  

Decidi fazer uma viagem à China em busca de mobiliário, decoração e iluminação. Fiz uma prévia exaustiva consulta de “traders”, selecionando o tipo de produto que pretendia e contactei-os, marcando com estes sucessivas reuniões. Marquei viagem para que coincidisse também com duas feiras de mobiliário, em Guangzhou e Shenzhen, cidades na província de Guangdong, no sul da China.

Apanhei um voo para Amesterdão onde, depois de esperar algumas horas, segui direto a Hong-Kong num 747 da KLM.

Hong Kong. Cheguei ao Oriente depois de 10 horas de voo. Neste tipo de viagens, chegamos a uma altura que vamos à casa de banho apenas para quebrar a monotonia do assento. A excitação tipo criança provocada pela expectativa da viagem, fez com que não pregasse olho durante toda a viagem.

Primeira tarefa: Trocar Euros por Hong-Kong Dólares e apanhar o comboio para o centro.

O Aeroporto de Hong-Kong é uma ilha a alguns quilómetros de Hong-Kong, pelo que a viagem de comboio foi o primeiro contacto com a idílicas paisagens chinesas.

Trocar Euros por RMB chineses foi depois de ter contactado um Táxi onde me apercebi de uma especial habilidade que os chineses têm para a condução “tipo circo“, mas achei que talvez fosse pelo facto do motorista estar com pressa. Apanhar o comboio para Shenzhen foi relativamente simples, pois estava ainda no “Ocidente” já que, à data, ainda Hong-Kong estava em período de estado de graça após a tomada do território pela República Popular da China.

O processo de entrada na China Continental propriamente dita foi algo dantesco. Estamos a falar de um controlo policial ao mais alto nível, com direito a revista, raios X, análise aos globos oculares para detecção de possíveis doenças associadas à “Gripe das Aves “ que, à data, já fazia parte das notícias de telejornal. Também a divisão física Hong Kong / China foi algo marcante. Deixamos o Ocidente e entramos no Oriente por uma fronteira física bem visível a olho nú, literalmente. Arame farpado, barreiras de aço, linha de água, barreiras de betão, tudo policiado por um contingente altamente armado e ameaçador. Após o controlo de entrada, procurar um Hotel para não ficar na rua.

Começou a aventura.

Primeiras dificuldades: Ninguém fala inglês e os que arranham alguma coisa é com uma pronúncia execrável, que muito dificilmente se percebe, mas pior ainda, não percebem o que lhes dizemos nem com gestos. Incomunicabilidade quase total. Depois de me ter desviado de dezenas de oferta de táxis manhosos, pareceu-me prudente procurar uma estação oficial dos ditos, bem enunciada nas placas da estação, em inglês. Durante esta “peregrinação” fui sendo constantemente abordado por  miúdos carregadores de bagagens a pedir para me levar as malas.

“Onde estou eu metido!!!”, pensava com os meus botões. Foi um impacto muito negativo. Não conhecemos ninguém, não nos conseguimos entender com ninguém, estamos fora da nossa área de conforto, estamos vulneráveis a um ambiente aparentemente hostil (felizmente vim a verificar que era perfeitamente seguro andar por todos os sítios sem qualquer problema de segurança). 

Taxistas e táxis da China. Não dá para descrever mas é do tipo…  falar ao telemóvel, beber, fumar, conduzir, coçar a micose, mirar o sexo oposto no passeio, passar sinais vermelhos, tudo, sempre, ao dobro da velocidade do permitido e em simultâneo. E eu tipo peixe fora de água.

Durante o período de preparação da viagem imprimi, em cantonês, alguns hotéis que me pareceram viáveis e que mostrei para me poder lá levar. O Hotel que indiquei ao taxista estava convertido numa caserna mal amanhada da policia chinesa que trabalha à paisana, ao qual o “recepcionista” com um Walkie-Talkie na mão me disse “Solly”, após ter percebido que eu vinha ao engano (baseado num anuncio na internet com direito a tradução para inglês, fotos dos quartos, da fachada do edifício)  e pelo facto de ser ocidental tinha direito a um pedido de desculpas: “Solly”. Lá segui viagem no mesmo táxi à procura de um novo hotel equivalente, que felizmente tinha tido o cuidado de trazer registado na pasta “Hotéis Shenzen“ como suplente, “just in case”, bastante útil como se veio a verificar.

Lá mostrei ao motorista a alternativa com tradução para chinês e este percebeu onde era. Shenzhen tem algumas centenas de prédios com altura superior a 30 andares, alguns dos quais com 40 ou mesmo 50 pisos, como de resto todas as cidades da China com populações acima dos 5 Milhões de habitantes. Todas crescem em altura, já que em largura é difícil. A China é muito montanhosa e todos os espaços são aproveitados. Os socalcos da cultura do arroz são um belíssimo exemplo que, infelizmente, não tive oportunidade de visitar.

Aí, ainda eu não tinha percebido que é muito difícil para um Ocidental fazer-se entender por estas bandas. Só comecei mesmo a perceber na recepção do Master Club, assim se chama a minha guarida de 13 para 14, quando dos 3 recepcionistas, 1 bagageiro, 6 raparigas perfiladas que abrem a porta do hotel e em coro dizem qualquer coisa parecido com xim pam pum, mais um ror de gente que por ali andava, ninguém dava cavaco de nada que não fosse, literalmente, chinês (cantonês).

A muito custo lá me fui fazendo entender, até que uma das recepcionistas se lembrou de chamar a gerente, que ao telefone, esclareceu as coisas.

Porreiro, suite 602, com vista para a rua e direito a cozinha com sala mobilada e tudo, mas o problema é que havia ali qualquer coisa que não me cheirava bem, mesmo cheiro, esgoto, cada vez que ouvia água a correr nos esgotos lá vinha o cheiro. Depressa tive que me habituar, pois nas ruas, nas escadas dos prédios, em todo o lado, cheira a esgoto e a uma porra de um cheiro a comida que ainda não consegui identificar, mas que enjoa que se farta, enjoa.

Mesmo com todas estas contrariedades estava, finalmente, instalado.

Com um jet-lag de quase dez horas e com mais de 24 horas de andanças em viagem, apetecia-me tudo menos sair, mas estava com a pica toda e queria desbravar terreno em Shenzhen.

 

1ª etapa cumprida

 

Continua…

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