sexta-feira, 15 de março de 2024

2º Capítulo - Segunda-feira, 14 de março de 2005


2º Capítulo

Shenzhen - China, Segunda-feira, 14 de março de 2005

(Continuação)

Mesmo com todas estas contrariedades estava, finalmente, instalado.

Com um jet-lag de quase dez horas e com mais de 24 horas de andanças em viagem, apetecia-me tudo menos sair, mas estava com a pica toda e queria desbravar terreno em Shenzhen.

No hotel onde desaguei, havia também certos pormenores como por exemplo a escada de serviço que parecia nunca ter visto lixívia, bem como o chão da cozinha, da casa de banho, os acabamentos não existem em nada, desde que sirva… está bom. O esquentador no duche, a 50 cm do utilizador do chuveiro, foi algo inédito para esta cabecinha pensadora. Para dificultar a coisa, conseguir que este trabalhasse foi uma autêntica epopeia técnica, pois só após 10 minutos de atenta pesquisa lá descortinei como é que este se mantinha aceso por mais de 10 segundos, a proporcionar uma água ora a ferver, ora a roçar o frio. Chinesices.

Após um duche reconfortante fui dar uma volta pelas redondezas e ao sair do quarto tomei o elevador que me tinha levado ao andar, pensava eu. Carreguei no que me pareceu ser a saída. Assim que as portas do elevador se abriram achei estranho o visual do hall. Quando dei por mim estava na receção duma esquadra de polícia, desta vez fardada. Assim que a sentinela me viu, deslocou-se cordialmente para mim e, estendendo o braço acompanhou-me na direcção do outro elevador, este com paragem no sitio certo, B1, aqui percebi que o bagageiro me tinha tentado dizer qualquer coisa “One” quando me tinha levado a mala ao quarto.

Após todas as tropelias, comer qualquer coisa e … cortar o cabelo.

Cortar o cabelo é das coisas mais fascinantes e baratas que se pode ter na China (30 rmb, ou seja 3 euros, com direito a massagem do couro cabeludo, massagem nas costas, no pescoço, nas orelhas, nos braços, na coluna, nas mãos, tudo isto ao longo de mais de uma hora. O que é facto é que saí de lá novinho em folha, depois de ter posto todas as massagistas e barbeiros a rir que nem perdidos durante todo o tempo que lá estive.

Para completar o ramalhete só faltavam os pés. Não é tarde nem é cedo. Entre dezenas de oficinas de automóveis, dezenas de vendedores de bebidas alcoólicas, volumes de tabaco, oficinas de mármore e lojas de tudo e mais alguma coisa, lá desencantei uma casa tipo templo com pessoas viradas para uma imagem na parede e com os pés em cima de uma maquineta que vibrava que se fartava, ao mesmo tempo que seguram com as duas mãos dois terminais metálicos ligados por fios à tal “ maquineta infernal “. Foi só olhar duas vezes e já o dono do “estaminé” me convidava a sentar num banco de plástico azul, que me pareceu aguentar-se intacto com a ajuda dos deuses retratados na parede, apesar dos meus 130 kg (à data tinha este peso).

Depois de preparado para a experiência, iniciou-se uma estranha e inédita sensação. Pareciam agulhas a espetarem-se na sola dos pés. O que é facto é que bastaram 5 minutos para “flutuar”, sensação que me ficou quando pousei os ditos cujos descalços no tapete coçado da sala virada para a rua. Resta dizer que o proprietário só falava chinês, bem como todos os outros ocupantes do espaço terapêutico e riram que se fartaram quando me viram naqueles amanhos. Ocidental, anafadinho, pouco à-vontade e novo no local a experimental algo. Eis os ingredientes necessários para pôr chineses a rir. Depois da missão cumprida, levantei-me e fui com a mão ao bolso para pagar o que fosse, ao qual o gerente da casa me agradeceu “Tak yu, tak yu”, pelo que percebi que não queria que lhe pagasse, indicando-me no tapete a palavra “Welcome”.

Lá fui à minha vida, comendo uma peça de fruta aqui outra ali e com pouca fome lá entrei num “fast-food” desconhecido e comi uma treta qualquer que sabia bem e não foi caro, diria mesmo barato.

Curiosa forma como a mímica não é exatamente igual em Portugal e na China. Junto de uma banca de rua que vendia fruta, pedi uma maçã com um gesto que em Portugal seria compreendido. Com o dedo indicador apontei para a maçã e, de seguida, levantei o mesmo, ficando na vertical. No meu entender dava a indicação de se tratar de uma unidade. A senhora entendeu este gesto como eu estando a apontar para o céu e seguiu a indicação, olhando para cima e de seguida olhou-me novamente com ar interrogador e desconcertado.

Também curiosa é a forma como se implantou o KFC- Kentucky Fried Chicken, às dezenas em cada cidade, sendo um sucesso de vendas na China com casas sempre cheias. Foi-me dito, posteriormente, que é necessário um investimento de 1 milhão de dólares em cada novo restaurante franchisado. Sendo a China um grande consumidor de carne de aves, o KFC está como frango na capoeira. É só faturar.

Já na rua, procurei algum sítio onde pudesse beber um cafezinho para compor o ramalhete. Não foi fácil mas entrei em algo parecido com um bar ocidental e perguntei “coffee”?  Resposta: Yes. Espetáculo. Até têm café e tudo!!! Maravilha. Deitei foguetes antes da festa. Levei com um abatanado clarinho, tipo café americano em copo de cartão. Foi melhor do que nada. Havia já mais de 24 horas que o café não fazia parte da minha dieta.

Regressei ao Master Club, o hotel .

O cheiro, a “bezuntice”, o esquentador e muitas mais coisas não me tiraram o sono, nem mesmo o buzinar continuo dos chineses, sempre, sempre, sempre, que desta vez até serviu de canção de embalar. Nem a cama riza como cornos me demoveu da soneca.

Tiro e queda.

Zzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzz…………….

 

Continua…

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